"Uma morte tragicômica
Isso quase ocorreu comigo, há alguns meses, numa das ruas mais difíceis de atravessar em Porto Alegre. Quando os carros vêm da Protásio Alves e entram na Mariante, o pedestre precisa ser ágil e oportunista na corrida para alcançar a outra margem. A faixa de pedestre que existe ali é como uma ponte de cordas sobre um desfiladeiro. Não é à toa que esse é um dos pontos mais frequentados pelos agentes da campanha de respeito à faixa de segurança.
Eu pretendia alcançar o canteiro central embaixo do Viaduto da Silva Só. Percebi que a espera seria eterna e deixei o braço tal qual uma cancela. Um carro parou. Atravessei a rua caminhando tranquilamente sobre a faixa, o olhar firme, queixo erguido, satisfeito por ter contribuído com um gesto físico e simbólico para uma maior conscientização do trânsito na Capital. Pouco antes de pisar no meio-fio, porém, um carro passou ao lado do que parara e, ignorando a faixa de pedestre, zuniu o motor barulhento pela pista livre. Juro que senti um deslocamento de ar na canela. Subi na calçada e olhei para a direita. Para minha surpresa, um fusca rosa afastava-se em alta velocidade em direção à Goethe.
Assim como aquele carro, a vida não para, e no caminho até em casa pensei nas implicações do caso: se o veículo tivesse me atingido, seria um acontecimento insólito. Quem espera morrer assim? Viver uma vida séria e, de repente, ter um obituário com ar de comédia publicado no jornal do dia seguinte: “um homem morreu ontem, na Capital, atropelado por um fusca cor-de-rosa.“ Para um humorista, entretanto, seria uma morte coerente, talvez até mesmo digna. Não deixaria de ser trágica, como a morte geralmente é, mas teria também um pouco de humor. Uma última piada, para os outros rirem.
De certa forma, a lógica do fusca rosa impera no trânsito brasileiro. Há muito tempo, a morte por atropelamento não é mais encarada como uma tragédia — se é que algum dia o foi. Ao abrir o jornal, o leitor depara diariamente com números que quantificam essas mortes, transformam-na em rotina, banalizam-nas. O banal é o meio termo entre a tragédia e a comédia. Portanto, quem duvida que, no futuro, essas mortes cheguem ao cúmulo de provocar risos?
Na dúvida, estique o braço para impedir."
Um comentário:
hehehehe é bem verdade! Sempre qd estou em POA com frequência me deparo com essas situações ao atravessar algumas ruas, o q sempre é motivo d "piada" para alguns amigos e irmã + velha com um clássico "tinha q ser a guria do interior" heheheheh
Postar um comentário