domingo, 21 de dezembro de 2008

Criança esperança

Crianças são bichos espertos. A gente se surpreende com elas e diz: "bah, essa geração é realmente mais inteligente que a nossa." Aconteceu comigo, quando eu era menino. E hoje sou tão burro quanto os que me antecederam. É assim mesmo. Pois capacidade de aprender depende de faixa etária, não de geração.

Veja o meu caso e o caso dos meninos da casa em que estou. Antes de chegar na Alemanha, estudei alemão dois anos e meio. Estou aqui há pouco mais de quatro meses, e dominar o alemão ainda parece uma tarefa distante, muito distante. Veja o caso agora de Benedito, 9 anos, e Iládio, 11, adotados há cindo anos por Christine, minha anfitriã alemã. Eles dominam o alemão perfeitamente.

Ok, alguém pode argumentar que eles estão aqui há mais tempo que eu. Acontece que eles dominam o alemão já faz anos, eu é que cheguei tarde para notar. E temos ainda a situação do Saboor. Afegão, 7 anos de idade, ele veio para cá em outubro de 2007 sem conhecer uma palavra do idioma. Depois de seis meses na Alemanha, ele já falava tudo. Se for comparar comigo, é covardia. Ele não precisou fazer curso no Goethe Institut nem nada.

Não moro, porém, numa casa de superdotados, e a prova disso é que sexta-feira conheci uma família inglesa em situação parecida. Eles moram em Haselünne há dois anos. Três crianças. Oliver, 8 anos, fala alemão tão bem que pensei que fosse daqui. Quando soube que era inglês, quis treinar com ele. O curioso é que a mãe de Oliver obviamente também está aqui há dois anos e não sabe praticamente nada de alemão.

O lado oposto dessa efervescência infantil é que ao aprender o segundo idioma eles esquecem o primeiro. Oliver é exceção, porque o fato de os pais não falaram alemão faz com que ele forçosamente use duas línguas. Para outras crianças, porém, o segundo idioma acaba se tornando gradativamente o primeiro. Saboor não fala mais persa. Iládio e Benedito falam português, mas o vocabulário básico, e pronunciado com sotaque alemão (dá para se dizer que eles falam o português que a Christine fala). Nesse aspecto, eu fico em vantagem pois não esqueci a língua materna*. Se bem que também tenho esquecido a segunda língua, o inglês. Leio e escuto bem, mas na hora de falar me atrapalho todo, porque vem à cabeça a estrutura gramatical alemã, onde um dos verbos da frase vai para o fim. De tal forma que hoje acontece o que me parecia impossível há alguns meses: meu alemão é melhor que meu inglês. E meu alemão, apesar dos elogios que escuto (dá para notar que é um elogio, isso eu entendo), nem é tão bom assim.

Fazer o quê. Não sou mais criança para saber tudo...

***

* Aqui uma pequena observação derivada do post anterior. O amigo Beto Frizero me lembrou que a ponta da cauda do escorpião chama-se ferrão. Então não é correto eu dizer que não estou esquecendo o idioma materno. Na verdade, quando falo com a mãe no telefone, de vez em quando me dá um branco para algumas palavras. Ou mesmo eu falo usando a estrutura gramatical alemã, pondo o segundo verbo no fim. Ok, agora você já sabe. Mas não conte para as crianças!

sábado, 20 de dezembro de 2008

Dia do dicionário

Este post é totalmente desinteressante. Parte mais duma necessidade minha de relatar duas situações inusitadas, embora sem graça nenhuma, do que realmente do fato de ter uma história boa para contar. Você realmente não precisa ler. Pare por aqui.

...

Bem, se você decidiu seguir adiante, a culpa é sua. Depois não venha reclamar que perdeu tempo lendo um post tão chato. Chato é você!

Enfim, quinta-feira, 18 de dezembro de 2008, foi o dia do dicionário para mim, graças a duas coincidências, que já explico. Importante a dizer (embora não tão importante assim) é que vim para a Alemanha carregando dois dicionários bilíngües: um Alemão-Português e vice-versa, da editora Langenscheidt; e outro Inglês-Português e também vice-versa, da Larousse. A minha meta era lá por agosto do ano que vem, às vésperas da volta à terra natal, comprar um dicionário Duden de alemão. Outra meta, para mais tarde ainda, era comprar um dicionário de inglês. Digo "mais tarde ainda", porque comecei a fazer minhas primeiras leituras em inglês aqui na Alemanha, e o plano então era melhorar para valer o idioma a ponto de não precisar mais de um dicionário bilíngüe.

Planos, planos, planos. Basta uma série de surpresas para desmoronar qualquer planejamento. Quinta-feira, eu à toa depois do almoço, convidei o Benedito para ir na biblioteca comigo. Não tínhamos nenhum livro para devolver, a idéia era passear mesmo. O Benedito é parceiro para todas as indiadas e topou. Nesse momento, ele era um agente do destino e não sabia. Na porta da livraria, havia uma caixa com livros para quem quisesse pegar. Não sei porquê, a biblioteca estava farta deles, queria se desfazer. Entre os livros, achei o "Deutsches Wörterbuch für Schule und Beruf", ou seja, o Dicionário Alemão para Escola e Profissão. Não é nenhum Duden, mas tem 456 páginas e me parece ser bom. Ademais, de graça até injeção na testa. A aquisição inclusive me provocou uma onda de motivação, e comecei a ler As Aventuras de Tom Saywer, do Mark Twain, traduzidos para o alemão. Parecia que estava entendendo tudo. O que é o efeito psicológico...

Aí cheguei em casa e me apazigüei assistindo a um filme com as crianças. Lá pelas tantas, a Kláudia, funcionária da clínica e também agindo em nome do destino sem saber, me pediu para ir com ela na casa antiga olhar umas coisas no porão. Pois você sabe, desde novembro estamos de mudança aqui na Alemanha, e até dia 31 de dezembro, quando entregarmos a antiga casa para a proprietária, vai ser assim, um ir e vir entre as duas habitações. Então fui lá com a Kláudia, pois no outro dia ela ajudaria a Christine a trazer coisas do porão e queria medir o tamanho da encrenca. A cada quarto abarrotado de bugigangas que passávamos, ela dava um suspiro de desespero. Foi então que dei de cara com um dicionário Oxford no meio das tralhas, esperando por mim.

A casa nova que a Christine construiu deve ser um terço do tamanho da casa antiga, que era gigante. De modo que a Christine está com muita coisa que não cabe na nova moradia. Nesse processo de se desfazer, de perguntar "quem quer? quem quer?", estou sempre atento para levantar a mão. O dicionário esse me chamou a atenção. Também estou de olho num lp do show do Simon & Garfunkel no Central Park, presente ótimo para a mamãe (beijo, mãe!). O negócio é que peguei o dicionário. Chegando em casa, folheei-o e fiquei surpreso. São 1580 páginas! Alguns verbetes têm desenhos explicando nomes de detalhes de objetos. Algumas palavras eu não conheço nem em português. Não sei, por exemplo, como se chama a ponta da cauda de um escorpião. Em inglês, agora sei, é sting. A Kláudia olhou e falou que também não conhecia a maioria dessas palavras em alemão.

Foram duas coincidências agradáveis, iniciadas realmente por obra do acaso. Ou sei lá, a essas alturas já dá para se questionar se não tem uma entidade superior querendo me dar uma força. Uma força idiomática. Ou meu cérebro, extenuado do esforço investido no alemão, está procurando descanso ao usar as capacidades paranormais, liberando espaço no hd encefálico. De qualquer forma, estou com o quite completo. Os quatro dicionários! Não há palavra que me vença agora!

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Bate o sino na cabeça do menino

No último domingo, aconteceu um evento em Meppen para arrecadar fundos para um projeto em Fortaleza que lida com crianças de ruas. Há um homem na cidade que ajuda monetariamente uma menina no Brasil já faz alguns anos. Foi ele quem organizou tudo isso. No evento, bolas autografadas por jogadores de futebol alemães foram leiloadas. Christine, minha anfitriã, quando leu sobre isso no jornal, entrou em contato com esse homem e contou que ela havia adotado dois meninos do Brasil. Ela e as crianças foram então convidadas para falar ao público no evento, de modo a tocar os corações e as carteiras das pessoas.

Mas já já mostro isso. Primeiro veja um pequeno teatrinho no Weinachtsmarkt, um mercado natalino que tem por tudo que é lugar aqui na Alemanha nessa época do ano.


Agora, o momento em que Christine e os meninos falam para o pequeno público. Atenção, pode parecer maçante, mas assista até o fim, porque algo realmente surpreendente vai acontecer.



Não sei o que foi mais engraçado, o quase-tombo da Christine (não filmei a sambadinha cai-não-cai dela por respeito, embora pudesse ir pras video-cassetadas) ou o Benedito se sentindo um pop star e não querendo abandonar o palco. Pensando bem, acho que o mais engraçado veio depois, quando fui chamado ao palco, de surpresa, e fiquei lá um bom minuto escutando um monte de palavras e entendendo apenas "Copacabana" e alguma piadinha infame sobre o Brasil, dita pelo homem no microfone. Mas ninguém filmou a cena.

Enfim, depois desse momento inutilidade pública, publico aqui um pequeno texto explicando melhor as tradições natalinas na Alemanha. Recebi o texto de Oliver Batsch, da agência de Aupairs pela qual eu vim parar aqui. Imagino que seja dele a autoria:
***

"São Nicolau: origens e lendas

A história de São Nicolau, bisco da cidade de Myra, na Ásia Menor, remonta ao século IV. Ele nasceu entre 270 e 280, de uma família rica oriunda da cidade de Lycia, na atual Turquia. Ficou órfão cedo e foi criado em um monastério, onde foi ordenado padre aos 17 anos. Ele viajou pelo Egito e Palestina antes de retornar a Lycia, para se t ornar o bisco da cidade de Myra, onde faleceu em 6 de dezembro do ano de 343.

Nicolau era um homem muito generoso, conhecido por sua caridade e sabedoria, e que abriu mão de sua riqueza em nome dos necessitados. Ele costumava sair disfarçado à noite para distribuir dinheiro, roupsa e comida aos pobres.

A mais famosa lenda em torno do santo é a referente a três irmãs pobres, que tinham pretendentes, mas, no entanto, não podiam pagar por seus dotes. Por ser muito tímido, São Nicolau subiu no telhado da casa das moças e jogou três moedas pela chaminé da casa. As três moedas caíram dentro de três meias, que secavam penduradas na lareira. Por esse motivo, estabeleceu-se a tradição alemã de deixar sapatinhos dentro de um prato, do lado de fora da casa.

Na Alemanha, durante o período natalino, a figura de São Nicolau está presente em todos os lugares, em chocolates de variadas formas.

Para os alemães, São Nicolau é um bispo de barba branquinha. Para a visita do santo, as casas e os sapatinhos das crianças precisam estar cuidadosamente limpos. Na véspera da visita, as crianças colocam, em um prato, em pares de botas ou em seus sapatos, cartas para o bom santo junto com cenouras ou outras comidas para o burro ou cavalo branco que o acompanham.

Tudo isso é posto do lado de fora da casa, debaixo da cama ou ao lado do aquecedor, na esperança de que seja encontrado pelo santo na manhã seguinte.

Durante a noite, São Nicolau vai de casa em casa carregando um livro, no qual estão anotados todos os pedidos de todas as crianças. Se elas se comportaram bem durante o ano, ele preenche os pratos, sapatos ou pares de botas com frutas, nozes e guloseimas. Se não, elas encontram batatas, carvão e galhos.

As crianças ensaiam poemas e canções para São Nicolau e elaboram pequenos presentes para ele. Amigos e vizinhos juntam-se para celebrar a data juntos. Velas e cenas da Natividade são acesas, contam-sem histórias, cantam-se canções. Tudo para aguardar a chegada do velhinho.

Ele chega com seu grande livro, um cajado dourado e um grande saco. Cada uma das crianças presentes coloca-se diante do santo, que pergunta a todas elas:

"Você se comportou diretinho? Fez o seu dever de casa? Manteve seu quarto arrumado? Você ajuda os seus pais?"

Então, ele abre o grande saco e distribui presentes e doces a todos. São Nicolau não se demora, pois ainda tem muitas casas para visitar.

Hoje em dia, em algumas partes da Alemanha, São Nicolau já se parece muito mais com o Papai Noel, e vem no dia de Natal, e naõ mais no dia 6 (dia do santo). A influência vinda de outros países, da televisão e grandes lojas torna muito mais difícil o encontro com São Nicolau de fato. Sua aparência atual sugere que as figuras centrais do Natal alemão, como São Nicolau e o Menino Jesus, estão se transformando."

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Comendo hambúrger em Hamburgo

A instantaneidade é uma das principais características da internet e também a que eu menos uso. Sempre acesso a partir de lan houses, quando então publico coisas que já aconteceram há muito tempo. Mas hoje não, hoje publico no frio da hora. Porque está realmente muito frio aqui em Hamburgo.

Ainda por cima, minha mochila está pesada, e eu, para justificar a decisão de trazer o notebook, parei no Mc Donald's, onde tem rede wireless, para atualizar o blog.

(Não sei por quê, aqui em Hamburgo me deu uma vontade de comer um hambúrger...)

Amanhã encontro outros Aupairs (leia-se "cuidadores de crianças", em francês) numa viagem a Lüneburg. Conto mas tarde o que for acontecer, até porque não posso prever o futuro!

Bem, olhe agora fotos e um pequeno vídeo de Hamburgo:



terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Nikolau, Nikolau, aquele que...

Dezembro é realmente um mês especial nos países europeus. Diferentemente do Brasil, onde o friorento Papai Noel aparece deslocado com suas roupas de lã em pleno verão, aqui o Bom Velhinho tem razão de ser. E em dezembro todo, com ou sem neve (mas sempre com frio), as famílias e o poder público se preocupam em cultivar as tradições natalinas.

Sexta-feira, por exemplo, 5 de dezembro, às cinco e meia da tarde (já noite aqui, pois é inverno), fomos eu, Christine e as crianças até a beira do rio acompanhar a chegada de Nikolau. Ficamos numa margem, onde bombeiros preparavam fogos de artifício. Na outra margem, crianças caminhavam com lanternas. Dentro de alguns minutos, elas se juntariam na ponte à comitiva guiando Nikolau em sua carruagem.

Essa descrição é melhor vista aqui, embora um pouco desfocada pela gravação noturna e pelo reflexo das luzes no rio:



O grande grupo, agora em centenas de pessoas e meias-pessoas (me refiro às crianças, que sempre ficam abaixo da barriga da gente), seguiu um bom trecho caminhando por entre as ruas de Haselünne, acompanhado do corpo de bombeiros. Quando chegamos ao pátio de uma das quatro escolas da cidade, paramos para ouvir Nikolau.

Ele diz isto, em alemão:



E por aí vai.

Depois as crianças cantaram uma música e teve uma pequena banda marcial, mas acabou a bateria da máquina e não pude gravar. O importante a dizer é que foi muito lindo. Ou pelo menos bonitinho.

As crianças ainda receberam guloseimas distribuídas pelos ajudantes de Nikolau. Entre eles um atlético rapaz de 18 anos que faz judô comigo. Reconheci-o por detrás do bigode pintado a caneta hidrocor. Na última vez que nos encontramos no tatami, ele me estrangulou, me deu chave de braço e me jogou no chão não sei quantas vezes. Agora era a hora de me vingar, roubando o microfone de Nikolau e incitando todas as crianças a se jogarem em cima dele, puxando cabelo e o que mais pudesse doer. Mas deixei assim, para não estragar a festa...

No fim do dia, a Christine pediu para nós deixarmos um tênis do lado de fora da casa, porque Nikolau viria e deixaria uma surpresa. Naturalmente, fomos espertos e escolhemos as maiores botas que temos. As crianças foram dormir, e depois Christine-Nikolau veio me chamar para mostrar o que esperava os meninos no outro dia:



E dezembro está só no começo!

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Ganha um prêmio quem disser como se escreve "criptonita" em alemão

Este post é em homenagem ao Betinho, grande amigo. Passeando num domingo de manhã em Düsseldorf, dei de cara com esta vitrine de uma loja de quadrinhos:


Como sei que o sonho do Betinho é ser o Superman, tirei essas fotos.

Betinho, pro alto e avante!

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Sankt Martin

No dia 10 de novembro, eu faria uma viagem, mas minha carona furou e eu tive de voltar para casa. Por um lado foi bom, pois pude acompanhar um pouco da tradição de Sankt Martin. O dia dessa festa tradicional na Alemanha é na verdade dia 11 de novembro, mas na véspera as crianças saem às ruas com lanternas, batendo de casa em casa. Elas cantam canções temáticas e depois, o mais importante para crianças, ganham doces.

Veja como foi na prática:

domingo, 23 de novembro de 2008

Na sexta, a primeira!

Nunca imaginei que minha primeira vez fosse acontecer logo na Alemanha. Mas primeiras vezes não têm hora nem lugar para acontecer.

Hoje acordei com ela e foi maravilhoso. Uma sensação estranha, começando com um frio aos poucos transformado em torpor. Começou na barriga e se espalhou prazerosamente pelo corpo. Sim, a primeira vez. A primeira vez com ela. Não tem como segurar a alegria. O dia fica lindo, o céu vem ao meu encontro. Sou um novo homem agora, pois eu a vi, branca em sua nudez.

Ivo viu a uva. Rubem Braga viu a viúva. Eu, parodiando Braga, vi a neve.

Comecei a ver a neve anteontem, sexta-feira, 21 de novembro de 2008, durante a correria da mudança para a nova casa. Eu esperava na oficina mecânica o conserto da caminhoneta de transporte. Enquanto bebia café, eu lia uma revista de fofocas para aprender palavras novas em alemão. Levantei a cabeça e vi os flocos de neve caindo lá fora.

- Neve! - eu disse, faceiro.

(Mentira, na verdade eu disse: "Schnee!")

Klaudia, funcionária do consultório da Christine, estava lá comigo. Perguntei-lhe se logo eu veria tudo branco, que nem nos filmes. Ela disse que não, as ruas ainda estavam quentes, a neve logo derreteria. Talvez em janeiro ou fevereiro, no auge do inverno, ela disse.

Então, eis que ontem de manhã fui acordado por três meninos gritando: "Augusto, Augusto, acorda! Supresa!" E a surpresa foi abrir a janela. Eis o que vi:




Havia nevado a noite inteira. Tudo branquinho, branquinho. Branquinho da Silva. Da Silva Hoffmeister.

Não tive muito tempo para me maravilhar, pois havia bastante trabalho pela frente. Além do mais, foi a primeira vez que eu vi a neve, a primeira vez também que a neve me viu, mas ela já tinha visto muita gente antes. Realmente, a neve não é bem-vinda, principalmente quando se está de mudança. As ruas tornam-se escorregadias, tudo fica úmido e as pessoas não gostam de levar boladas de neve na cabeça. Em todo caso, depois de descer todos os móveis do meu quarto, que fica(va) no segundo andar da casa, achei um tempo para descansar e tomar um café com Mawil, sobrinho da Christine que estava me ajudando. Pela janela, víamos o campo embranquiçado. Iládio, Benedito e Saboor construíam lá fora (por que se fosse dentro de casa haveria briga) um boneco de neve.

O dia passou, como sempre passa. A neve não parou de cair, contrariando assim as expectativas de todos. Menos a minha; nunca antes havia visto neve na minha vida, agora queria ver bastante. No intervalo entre uma tarefa e outra, eu parava no beiral da nova casa e olhava os flocos caindo. Em outros momentos, eu escrevia uma frase na neve, em alemão, ou então jogava uma bola no Mawil.

Sei que ainda verei muita neve por aqui, mas a primeira vez a gente não esquece.

Minha primeira neve, não te esquecerei jamais!

Derreta em paz.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Os colonos em Colônia

No dia 24 de outubro, sexta-feira, viajei a Köln, também conhecida como Cologna ou Colônia. Comecei a viagem já com o pé esquerdo, como todas as viagens que tenho feito aqui até agora: eu comprara a passagem algumas semanas antes com o objetivo de encontrar uma jornalista em Düsseldorf, ali pertinho. Na véspera, porém, ela me escreveu um email. O encontro estava cancelado, porque ela precisava viajar para o Brasil com o governador. Imagina se a jornalista deixaria de ir por causa de um jovem brasileiro à toa na Alemanha que queria conhecer a instituição onde ela trabalha...

Decidi viajar de qualquer jeito, até porque não tinha como trocar a passagem. Desembarquei em Köln, tremendo de medo de um fiscal me parar (eu de fato teria de descer em Düsseldorf, uma estação antes). Deu tudo certo. E, para minha surpresa, mal saí da estação central de Köln, dei de cara com esta maravilha:


Essa igreja milenar (não lembro exatamente o quão milenar ela é) chama-se Dom. É linda e enorme. Fora isso, para quem não parou para ler as placas e tem pouca formação teológica e/ou arquitetônica, Dom é igual a outras igrejas que têm por aí, com o acréscimo de ser perfeita para uma foto estilo turista brasileiro na Europa.


Caminhando ao léu, fui parar em alguns pontos turísticos da cidade. Não vou citá-los, porque é muito chato sem fotos. Só posso dizer que depois de cinco horas caminhando com uma baita mochila nas costas, sozinho, pensando em dinheiro (no pouco que tinha à disposição e nos vários gastos que estavam por vir) me deparei com um daqueles momentos tão comuns de fadiga e estresse em viagens que não aparecem nas fotos. Para compensar, decidi gastar comendo uma pizza. É assim, quando me estresso, agrado primeiro o estômago, que distribui o contentamento aos poucos pro resto do corpo.

Estava nessas, quando o João me ligou. O João estuda engenharia elétrica na UFSM. Participamos juntos do PET (Programa de Ensino Tutorial), do Mec, e com freqüência nos víamos, embora nunca tivéssemos conversado, acho. Ele está aqui na Alemanha fazendo intercâmbio profissional. Combinamos essa viagem juntos, de parceria. Eu ainda tinha dúvida se ele chegaria na sexta mesmo ou no sábado, então foi realmente uma ótima surpresa a ligação dele.

Para iniciar os trabalhos, bebemos uma cerveja. João tinha uma cachaça mineira na mochila, o plano era virar a noite dormindo na estação de trem, economizando em pouso. Ligamos para o Tim, um alemão de 18 anos que havia feito intercâmbio em Santa Maria, RS. Ele apareceu com um amigo. Ambos muito atenciosos, nos levaram para conhecer a cidade. Os dois podiam ser guias turísticos, sabem muitas coisas sobre a história de Köln.

Paramos num bar, bebemos um pouco (eu e o João, pois Tim e o amigo não bebem) e voltamos a caminhar. A dupla de brasileiros aqui sempre com a mochila nas costas. Resultado: às 2 horas da manhã, estávamos tão cansados, mas tão cansados, que não tivemos outra solução senão pernoitar num albergue. Ok, sem problemas, às vezes tem-se de gastar um pouco, dormir até meio-dia para recuperar o corpo. Que nada! Às 9h e meia todos tinham de fazer check-out, sem exceção. Ou seja, pagamos uma diária inteira para dormir cerca de seis horas, se chegou a tanto.

Até aí a viagem estava realmente uma Scheisse (melhor dizer em alemão, para não ofender)! Mas então veio o sábado e as coisas começaram a melhorar. Primeiro, o povo do albergue deixou que guardássemos nossas mochilas lá durante o dia, o que já aliviava a dor nas costas. Depois, chegando no Museu do Chocolate, aceitaram tanto a carteirinha de estudante do João quanto a minha de Aupair, então tivemos desconto.

No Schokolademuseum, fiz alguns vídeos:










Seguimos caminhando. Ensinei ao João que quando se vê uma bifurcação na Alemanha, tem-se de pegar o caminho menos provável de levar a um lugar legal. Logo provamos minha teoria. Fomos parar no centro velho da cidade, talvez o único ponto turístico que não tínhamos passado ainda.


Na rua, reencontramos a Kelly, brasileira que agora mora na Suíça. Digo reencontramos porque ela nos parou na rua no dia anterior, ao escutar o familiar idioma natal, somado a uns "tchês" e "bahs" aqui e acolá.


"O tempo passa. E onde o tempo tem passado, intala-se o passado." Pois o tempo foi passando, que nem no texto da HQ "Transmutações Políticas". No fim do dia, já cansados, decidimos visitar a universidade. Nova maré de azar. Era noite, estava tudo fechado. Dessa vez, porém, era tudo ou nada em questão de grana. Havíamos decidido passar a noite na estação de trem, não pagaríamos de jeito nenhum para dormir num albergue. Nesse dia tomaríamos o primeiro de muitos goles da cachaça, para agüentar o tirão. Era cedo, porém, e estávamos cansados, sem destino e sem motivação.

Foi então que fez-se luz.

Passando numa rua deserta qualquer em direção aonde ouvesse pessoas e festas, cruzamos na frente dum quiosquezinho. Eu pensei: por que não entrar e ver quanto custa a cerveja? Estávamos perto da universidade e, por mais que os estudantes na Alemanha não devam (suposição minha) ser tão miseráveis quanto os estudantes brasileiros somos, botecos universitários são universalmente mais baratos. Eu estava com razão. Um euro por uma cerveja de 600ml! Um euro! Não tenho como explicar o que representou o achado na nossa motivação. Até então, era 1,40 por uma cervejinha pequena, mixuruca. Agora um mundo de possibilidades se abria à nossa frente. Começou nossa maré de sorte.

Sentamos numa mureta, bebendo e conversando, recuperando as energias e se animando pra noite. A dona do quiosque se solidarizou conosco e veio nos trazer sanduíches. Seguimos adiante rumo às luzes boêmias. Conversávamos com as pessoas nas ruas, contentes por poder (tentar) fazer isso em alemão. Enfim, tínhamos o mundo aos nossos pés!

Ao fim de uma série de andanças, fomos parar neste lugar:



Depois de um certo tempo lá, bateu novamente o cansaço. A noite anterior mal(e pouco)-dormida, o dia inteiro de caminhada e o desânimo prévio bateram pesado. Antes de ir para a estação tentar a sorte com a cachaça, decidimos parar para comer um Döner, uma comida turca bem conhecida, que cumpre por aqui a função do xis e do cachorro quente na saída das festas. Achamos um lugar que vendia por dois euros, metade do preço que estávamos pagando até então. Desconfiados, perguntamos o preço de novo. Era verdade. Desconfiamos da qualidade, mas depois vimos que era bem bom. Realmente, estávamos agora com sorte.

Enquanto comíamos Döner, puxamos assunto com duas alemoas: Tina (que fala um pouco de espanhol, pois estivera na Bolívia) e Janette. Seguimos juntos, o quarteto idiomático. Logo encontramos uma porção de amigos delas, ao ponto de, em certa esquina, estarmos todos numa verdadeira torre de Babel: espanhol, português, inglês, alemão. Quando o pessoal quer se entender, dá-se um jeito!

Depois disso, fomos parar numa série de bares verdadeiramente nativos (com isso quero dizer: "sem glamour, mas autênticos, legítimos DCEs e Macondos de Colônia"), dos quais não me lembro muito bem. Ganhamos uma hora a mais porque começava o horário de inverno naquela noite. No fim, por sorte (estávamos merecendo), paramos num bar com um belo sofá, excelente para dormir. Como a festa durava até oito horas da manhã, tivemos um tempo para recuperar um pouco as energias, apesar de um bêbado que outro bem malas que vinham nos acordar para puxar papo.

Ao fim da maratona, estávamos com esta cara:


Ainda encontramos, perto das oito horas da manhã, um homem na rua muito estranho. Paramos para pedir-lhe informação, ele veio com uns papos muito loucos, que nem vale a pena tentar traduzir. Apenas eu e o João nos olhamos, como quem diz: "cada tipo que aparece!" São dessas coisas que acontecem e não têm explicação.

Depois nos despedimos, eu e o João, e fomos, mortos de cansados, de volta aos respectivos lares. Eu voltei para Haselünne, onde encontrei minha família anfitriã de volta de Paris, onde passaram um dia em função dum trabalho de escola do Iládio sobre a França. Dormi doze horas ininterruptas. O João voltou para Bocholt, onde faz estágio numa Fachschule. Dormiu quinze horas.

A vida, por si, voltou à rotina com o chegar da segunda-feira. Da viagem à Köln, ficaram agora apenas estas fotos e as lembranças esparsas.


É isso.

sábado, 8 de novembro de 2008

É vero, é veríssimo!

Acabo de sair dum bazar aqui em Haselünne. Olha o livro que achei por lá:



Diz na lombada do livro: "Die Zeit und der Wind", Erico Verissimo. Para quem disser direitinho o nome traduzido, compro e dou de presente. Claro, se você arcar com os custos de frete...

Aliás, estou à procura de uma alternativa para enviar livros para o Brasil. Posso enviar até vinte quilos pagando 80 euros. Acontece que livro é pesado, eu precisaria pagar muitas vezes esse valor para enviar todos os trinta que já comprei. Alguém tem uma saída? Será que é muito caro extrapolar o peso permitido na bagagem quando eu voar de volta para o Brasil?

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Lübeck Extra Turbo

Com o patrocínio exclusivo de Família Hoffmeister - Crianças Felizes na Alemanha, fui no meio de outubro conhecer a cidade de Lübeck, perto do Mar do Leste. A viagem começou no dia 17 bem cedo, com a comemoração do aniversário de cinco anos de quando a Christine e as crianças se conheceram. (Não lembra da história? Clique aqui!)


Lindo o bolo sobre a mesa, não? Alguns minutos depois, ele caía dentro do carro, quando Iládio o passava para mim... No meio do caminho entre eu e ele, portanto. Sorte a nossa, pois livrou os dois da culpa!

Lambança limpa, seguimos viagem. Fomos parar na casa de amigos da Christine, muito simpáticos. Mas antes de apresentá-los, preciso mostrar que amor de meninos são o Iládio e o Benedito:


O Saboor, 7 anos de idade, se sentiu o máximo, não sendo o caçula da casa. Pegou no colo o Titus, um lindo bebezinho alemão.


Agora, o time inteiro!


Sentados (da esquerda para a direita): eu, Kay, Kirsten, Iládio e Christine.
Sentados no colo, faceiros, porque ainda não são pesados: Saboor, Titus e Benedito.
Deitado no sofá, com dor de barriga: Mattis.
Agachados: ninguém.

Bem, agora fotos de Lübeck, que visitamos no dia seguinte:


Acredite se quiser (se não quiser, não tem problema: não é tão importante assim!), os bonecos da última foto são todos feitos com Marsipan, uma massa para fazer bolo bem conhecida por aqui. Os peitões da manequim também.

Massa, não?


Pernoitamos num albergue e, no outro dia, fomos conhecer o Mar do Leste.


É isso.

Você ainda não está com inveja? Droga! E eu fazendo de tudo para dar um ar de turista chique na Europa...

Bem, melhor aguardar o próximo post, com relatos da viagem à Köln...